À beira da superlotação, HC admite falta de profissionais da saúde para cuidar de leitos de UTI

Situação é admtida pelo superintendente do hospital; confira depoimentos de profissionais da saúde

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Embora registre, no momento, ocupação de 95,2% das vagas destinadas a pacientes adultos em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) para o tratamento de covid-19, um fantasma maior tem assombrado as autoridades do setor em Ribeirão Preto: a falta de profissionais.

Ribeirão dispõe, hoje, de 167 leitos de UTI, distruídos entre diversos hospitais. Destes, 159 estão ocupados, em dados atualizados neste sábado (27). São, portanto, sete vagas que separam a cidade do colapso. E, em hospitais da cidade, os afastamentos de profissionais que pegaram covid-19 e o aumento na demanda já faz com que equipes funcionem sem todos os integrantes e que profissionais da saúde tenham que trabalhar mais que o recomendado pelas autoridades.

Embora sem alarde, Benedito Maciel, superintendente do Hospital das Clínicas, confirmou a informação. Ele ressalta que, ainda que Ribeirão tenha estrutura física e equipamentos para abrir novos leitos, faltam profissionais capacitados.

“Resta, agora, a gente conseguir conciliar o pessoal necessário. Estamos fazendo um remanejamento de médicos de outras especialidades para dar apoio nessas áreas, mas precisamos de médicos que tenham treinamento específico em terapia intensiva para ser incorporados. Estamos em buscas dessas contratações. O mesmo em relação ao pessoal de enfermagem”, afirmou, em entrevista exclusiva ao Grupo Thathi de Comunicação.

 

Vale ressaltar que parte significativa dos leitos de UTI da cidade estão no Hospital das Clínicas, referência regional no atendimento ao covid-19. São 61 leitos, com ocupação de 55 deles, segundo dados divulgados neste domingo (28). A ocupação no HC, portanto, chega a pouco mais de 90%.

A reportagem questionou a prefeitura de Ribeirão Preto sobre o assunto, mas não houve resposta até a publicação da matéria. Se isso ocorrer, o texto será atualizado.

Exemplo

É o caso de uma enfermeira ouvida pelo Grupo Thathi com a condição de não ter o nome revelado. Na última sexta-feira (26), quando a ocupação dos leitos de UT chegou a 97%, ela relatou que estava trabalhando de forma contínua há 18 horas. O plantão geralmente é de 12 horas.

“Eu até chorei quando tive que ir pra casa. A equipe que ficou não tinha todos os profissionais. Estamos tendo que nos desdobrar”, conta ela, que também trabalha em outro hospital público da cidade. “Lá, é ainda pior que aqui [no HC]. Não tem mais uma vaga, está tudo lotado”, conta.

Já um médico ouvido pela reportagem conta que a situação se aproxima do limite. “Já estamos começando a escolher pacientes que irão para o respirador. E essa situação pode se agravar ainda mais se houver falta de medicamento para entubar os pacientes”, relata.

Dados

A reportagem do Grupo Thathi tentou conseguir, oficialmente, qual o déficit de pessoal no setor da saúde para cuidar da UTI. Não conseguiu números, mas entrevistou cinco pessoas, sendo três médicos e duas enfermeiras, além de dois gestores. Há funcionários de quatro hospitais da cidade. E o cenário é efetivamente preocupante.

Paciente internado com covid-19 – Foto: Reprodução

“Se eu tivesse que chutar um número, diria que seriam necessárias ao menos dez equipes completas, incluindo médicos e enfermeiros, para fazer o atendimento da demanda atual e ainda criar novas vagas. Estamos falando de pelo menos 50 pessoas capacitadas”, conta um dos gestores.

Para o professor Domingos Alves, ligado à Universidade de São Paulo e um dos principais nomes na análise da atual situação da pandemia na cidade – ele acertou com precisão o atual quadro de falta de leitos com antecedência de dois meses – a falta de pessoal qualificado é o grande gargalo em Ribeirão.

“As autoridades, seja, estaduais ou municipais, apostaram na ideia de que poderiam criar mais leitos. Ao invés de focar no isolamento, passaram para a população a imagem de que todos poderiam ficar doentes, pois teriam leitos. Isso complicou a situação ainda mais. Não só pela falta de equipamentos, que não é o maior problema, e sim também pela falta de profissionais especializados e também de medicamentos”, analisa.