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Sobre opiniões, artistas, aeronaves e partidas precoces

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Opinião é algo que está cada vez mais longe da extinção. É tanta bandeira tremulando de cá e de lá que tudo fica meio barulhento. Muitos dispostos a falar, raríssimos dispostos a ouvir, e o ambiente online, principalmente, fica como uma praça pública em dia de eventos grátis com muita gente aglomerada falando enquanto a música rola sem ser muito ouvida e ambulantes disputam os tímpanos disponíveis vociferando seus bordões em repetição em busca do cliente que reside em cada um de nós. Tenho a impressão de que vivi o momento de transição entre os dias nos quais a maior parte das pessoas era até meio alheia a opiniões, antes da expansão massiva da internet por aqui, no tempo em que o dinossauro Orkut ainda caminhava sobre a Terra e apenas nos introduzia ao mundo dos avatares digitais. Mas, esse não é um texto de opinião contra opiniões.

Penso nisso enquanto leio as notícias do dia acompanhadas sempre da parte mais estranha e bizarra do Brasil virtual, o submundo dos comentários. Quem já frequentou este famigerado local como observador sabe do que estou falando. Na ordem do dia, a partida precoce do cantor Gabriel Diniz chama a atenção. No universo paralelo dos comentários houve tempo (sempre há) até para a espécie que também está cada vez mais longe da extinção e que habita como um parasita as redes sociais, a nada auspiciosa figura do hater. Gente que comemora morte de gente é gente? Aprendi que não se faz juízo de valor no momento da morte de alguém. Encerro a divagação pela dimensão das opiniões esvaziado delas e mais afeito a memórias. A morte de um artista num acidente de avião em 2019 lembra a morte de todo um time de futebol num acidente de avião em 2016, que lembra a morte dos Mamonas Assassinas em 1996, que lembra a morte de Buddy Holly em  1959 num acidente que também vitimou o cantor Richie Vallens, outro cantor que se destacava na época com o sucesso “La Bamba”.

Era fim de maio, como agora, mas em 1957, quando o compositor, cantor e guitarrista americano, um dos pioneiros do rock, lançou o single que foi seu primeiro sucesso, “That’ll Be the day” com a banda The Crickets, cujo nome foi uma das inspirações para o batismo da banda The Beatles, anos depois. Buddy foi influenciado por Bill Haley e Elvis Presley, e influenciou muitos de Beatles até Rolling Stones. John Lennon regravou músicas dele num álbum com versões de 1975 chamado “Rock’n Roll” (em alguns momentos dá pra notar Lennon imitando Buddy com a voz) que também tem outros autores dos primórdios do rock. A formação de banda que depois virou clássica – o trio com bateria, baixo e guitarra – também foi marca dos Crickets além do óculos do líder do grupo, que, na verdade, nasceu com o nome Charles Hardin Holley. Em 1978 lançaram o filme The Buddy Holly Story, que conta mais dessa figura deveras interessante.

 

Memórias fazem conexões que adquirem vida própria e seguem, de galho em galho, desencadeando outras memórias que vem tecendo este nosso fio da meada. Vale lembrar também da banda de Rythm and Blues Lynyrd Skynyrd que perdeu quase todos os integrantes num acidente de avião no auge da carreira em 1977.  Ottis Redding, grande voz do soul, é mais um destes que se foi numa queda de aeronave. Ele tinha apenas 26 anos em 1967 quando o avião no qual estava caiu num lago e matou também integrantes de sua banda. O caso do acidente de Buddy Holly e Richie Vallens ficou conhecido na época como “O Dia em que a Música Morreu”. Na verdade, a música, assim como o ser humano, morre e renasce todos os dias. Nos dias em que nasce, celebramos. Nos dias em que morre, relembramos.

Buddy Holly – That’ll Be The Day