Home Notícias Cotidiano É possível a execução da pena após a condenação em segunda instância?

É possível a execução da pena após a condenação em segunda instância?

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Depois da recente decisão do STF acerca da impossibilidade da execução da pena antes do trânsito em julgado, após condenação por Tribunal, em segunda instância, surgiu um novo Fla x Flu, em todo país, com debates acalorados a respeito de tal possibilidade. Sem qualquer viés ideológico, seria do ponto de vista técnico possível tal execução?

O grande obstáculo apontado é o artigo , inciso LVII, da Constituição Federal, que preceitua que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, a famosa presunção de inocência, tida por grande parte dos juristas como cláusula pétrea.

Assim, o problema que aqui se apresenta é se prender alguém, antes de esgotados todos os recursos possíveis, não feriria tal presunção. Historicamente – não só no Brasil, mas também no exterior -, parece que não. Isso porque sempre houve a prisão processual penal – no nosso caso, as prisões preventivas e temporárias – feitas justamente para serem aplicadas antes da condenação definitiva, caso haja risco de fuga ou chance de cometimento de outros delitos ou destruição de provas. E exatamente isso que estabelece o artigo 283 do Código de Processo Penal, ao dizer que ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

Todavia, ao mesmo tempo em que o referido artigo autoriza a prisão processual penal antes do trânsito em julgado da condenação – o que nunca foi entendido como afronta à presunção de inocência – veda expressamente a restrição à liberdade fora dessas hipóteses. Em outras palavras, o primeiro obstáculo à execução provisória da pena se encontra nesse dispositivo legal.

Consequentemente, em princípio, uma saída seria simplesmente alterar a redação desse artigo, exatamente o que prevê o Projeto de Lei que tramita no Senado, de acordo com o qual, o texto legal passaria a ser no sentido da possibilidade de prisão em decorrência de condenação criminal exarada por órgão colegiado ou em virtude de prisão temporária ou preventiva. Tal saída seria muito mais simples porque não exigiria nenhuma mudança constitucional, razão pela qual teria um trâmite legislativo muito mais simples e rápido.

No entanto, ainda permaneceria a dúvida a respeito da constitucionalidade de tal alteração. Ela feriria a presunção de inocência? A Constituição Federal apenas diz que ninguém será considerado culpado antes de decisão definitiva, nada dizendo sobre vedações à prisão nesse momento. Estaria tal vedação implícita? Essa é uma questão que certamente chegará ao STF, caso o referido Projeto de Lei seja aprovado.

Outra saída seria alterar o texto constitucional, autorizando essa prisão ou entendendo que já haveria o trânsito em julgado após o julgamento em segunda instância e que eventuais recursos aos Tribunais Superiores seriam ações revisionais. Essa solução evitaria discussões acerca da constitucionalidade da medida, mas esbarraria na discussão sobre o caráter pétreo de tal cláusula.

Se o entendimento for no sentido de que tratamos de uma cláusula pétrea, não há como modificá-la por meio de emenda constitucional. Para muitos doutrinadores, isso só seria possível por meio da promulgação de uma nova Constituição – para outros, haveria também a possibilidade de modificação via plebiscito.

De qualquer forma, os próximos meses prometem um intenso debate. Felizmente, qualquer que seja o caminho escolhido, haverá participação do Congresso Nacional, onde estão os representantes da população, eleitos democraticamente. Dessa forma, o que se espera é que o fruto desse debate realmente espelhe a vontade popular, já que todo poder emana do povo e em seu nome será exercido.