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Depressão x frustração – temos tratado frustração como depressão?

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Depressão x frustração – temos tratado frustração como depressão?
Médica, Rivia Tirone é psiquiatra e psicanalista em formação

Olá pessoal!

Vamos falar de depressão? Ou seria frustração? São situações semelhantes com abordagens diferentes.

Somos seres que fugimos da dor e buscamos o prazer. Desde os nossos ancestrais somos indivíduos que necessitamos de prazer. Temos suprimido os nossos sentimentos de modo a não tolerar a dor. Vivenciar perdas, experimentar melancolia e tristeza diante das frustrações são processos importantes para o amadurecimento psíquico e aprimoramento das relações sociais.

Alguns autores estudam a importância da capacidade de adiar as gratificações e suportar a frustração para o desenvolvimento sadio da criança. Para Cassorla (1992), a criança adquire capacidade de pensar a partir de uma frustração, de uma falta, de um sentimento, mas alerta para o fato de que essa frustração deva ser suportável para o bebê, ou terá efeito negativo no desenvolvimento.

A falta de preparo para suportar e superar frustrações na infância pode aumentar ainda mais a inclinação hedonista no futuro, caracterizada por crises emocionais desencadeadas em decorrência de contrariedades pequenas ou insatisfações crônicas. É aqui que mora o perigo! Se não houver o exercício, na vida infanto-juvenil, que propicie superações e autorregulação na lida com os conflitos pessoais, será inevitável eliminar o estado frustrado desse indivíduo, tornando-se algo que se crônico em seu estado emocional.

Os indivíduos mais vulneráveis à depressão a partir do estado melancólico permanente são aqueles que, geralmente, têm baixa tolerância à frustração, são rígidos e inflexíveis em seus valores, estabelecem metas difíceis para si mesmos. São intransigentes em seus julgamentos, experimentam culpa e se impõem sofrimentos. Já carregam consigo uma natureza emocional mais negativa.

Lembram-se do clássico desenho animado – Lippy e Hardy – “oh céusoh vida, oh azar, isso não vai dar certo”? A Síndrome de Hardy  é a síndrome do “coitadista” e do conformismo, e talvez tenhamos mais “Hardys” que depressivos de fato.  É fundamental adaptar se à realidade existencial da vida adulta. A depressão não pode ser compreendida como sinônimo do sentimento de tristeza e melancolia que qualquer pessoa experimenta diante das dificuldades e frustrações, mas sim, como um quadro patológico próprio e específico, relativamente emancipado dos eventos existenciais.

Existem fatores genéticos envolvidos nos casos de depressão, doença que pode ser provocada por uma disfunção bioquímica do cérebro, deficiência de serotonina. Entretanto, nem todas as pessoas com predisposição genética reagem do mesmo modo diante de fatores que funcionam como gatilho para as crises: acontecimentos traumáticos na infância,  doenças sistêmicas, consumo abusivo de drogas lícitas (ex: álcool) e ilícitas (ex: cocaína), certos tipos de medicamentos (ex: anfetaminas – também existentes em medicamentos).

Sintomas como tristeza, desinteresse, apatia, perda de prazer com as coisas, desânimo, sensação de cansaço, ansiedade, prostração, abatimento intelectual, moral, físico, letargia, estresse e melancolia podem ser considerados da doença depressiva ou algum transtorno do afetivo, mas muitas vezes trata-se de um reflexo emocional de circunstâncias vivenciais frustrantes e mal resolvidas. A depressão acaba sendo uma espécie de irmã gêmea da frustração, as quais devem ser tratadas de modos diferentes. A frustração pode ser amenizada com psicoterapias, com entendimento e fortalecimento da capacidade de lidar com adversidades, empoderamento individual e exercício da resiliência.

Já a doença Depressão deve ser diagnosticada por um profissional médico que irá indicar a conduta medicamentosa e a psicoterápica individualizadas, com acompanhamento mensal, eliminando potenciais riscos para si e para outro. A doença depressão adoece não só o individuo, mas também a família, que também deve ser incluída pelo médico na escolha do melhor tratamento. Esperar de um medicamento a “pílula da felicidade” é reduzir a capacidade ou status de ser humano. Portanto, a depressão é biológica e frustração é existencial.  Dificuldades existem para serem resolvidas!  E a ajuda profissional poderá direcionar seu caminho.

Boa semana pessoal! Até mais!