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A síndrome do poder

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A síndrome do poder
Carlos Cezar Barbosa é Promotor de Justiça licenciado em Ribeirão Preto. Mestre em direito penal, atualmente ocupa o cargo de Vice-Prefeito de Ribeirão Preto

Grande parte das pessoas que exercem alguma espécie de poder, ainda que transitoriamente, do porteiro de boate até os grandes poderosos, incluindo, é claro, os exercentes de mandatos políticos e integrantes de carreiras de Estado, é acometida pela síndrome do poder, que pode ser classificada em síndrome do poder no sentido estrito e síndrome do pequeno poder.

A primeira espécie é um tipo de transtorno de personalidade narcísica, que, para o senso comum, leva o indivíduo a ter um exacerbado amor por si mesmo e por sua imagem. A síndrome do poder se identifica com o narcisismo perverso, que gera fantasias de sucesso, sentimento de superioridade frente a terceiros, arrogância, falta de empatia, necessidade de demonstrar conhecimento e exagerado egoísmo.

Pessoas acometidas pela síndrome não admitem ser confrontadas e jamais assumem erros. Chegam a se tornar perigosas quando sentem sua pretensa superioridade ameaçada. A famosa frase “você sabe com quem está falando?” é comumente utilizada pelos portadores da SDP.

Shakespeare acertou na mosca quando sentenciou que “o mal da grandeza é quando ela separa a consciência do poder”. Para essa categoria, o poder tem um fim em si mesmo. Não deve ser utilizado para outra finalidade, senão a de servir ao próprio poderoso.

Quanto maior o número de pessoas submetidas, de alguma forma, ao portador da síndrome do poder, mais acentuadas as características anteriormente mencionadas. O diagnostico da síndrome dispensa avaliação médica. Qualquer pessoa de inteligência mediana pode identificar o doente. Aqueles que detêm senso crítico mais apurado consideram o tipo como idiota, mas perigoso.

Quando hierarquicamente superiores, na esfera pública ou na iniciativa privada, e como já disse, eles estão por todos os lados (no Executivo, no Judiciário, no Legislativo, no Ministério Público, no alto comando das polícias, nas universidades, nos templos e nas grandes corporações) os portadores de SDP parecem vacinados contra a humildade, são especialistas em manipular pessoas, têm incrível habilidade para mentir (se julgam capazes de vender como oásis um lugar decadente) e adoram humilhar os colaboradores.

Não aceitam sugestões e vivem arrotando conhecimento (muitas vezes obtidos com a leitura de orelhas de livros). Ignoram a lição dos sábios, no sentido de que o conhecimento é bonito quando serve para encantar as pessoas, mas ridículo quando utilizado para subestimá-las. São péssimos líderes, porque jamais reconhecem a capacidade de terceiros, e como se sabe o verdadeiro líder conquista o seu grupo pelo reconhecimento da capacidade e do trabalho alheio, pela empatia, pela atenção e pelo relacionamento cordial.

Por outro lado, adoram bajuladores, que por conveniência ou idiotice, vivem massageando seu ego, e isso mostra que nem Maquiavel eles conhecem bem, pois dizia o conselheiro da corte “O primeiro método para estimar a inteligência de um governante é olhar para os homens que tem à sua volta”. Dessa forma, seja qual for o cargo que o portador da SDP estiver exercendo, será sempre um profissional medíocre e perigoso.

Tão perigosos quanto os portadores da SDP, são aqueles acometidos pela síndrome do pequeno poder. Esse tipo de doença pode ser causado pelo ressentimento, pelo recalque e pela inveja, e atinge profissionais que ocasionalmente exercem algum poder sobre terceiros. Podem adquirir a SDPP policiais, fiscais, porteiros, seguranças, chefes de escalão inferior e árbitros de futebol, dentre outros.

Pessoas com SDPP, a exemplo dos portadores da SDP, são totalmente desprovidos de senso ético. São sádicos, covardes e podem chegar ao orgasmo quando praticam algum tipo de arbitrariedade. Sabem aqueles seguranças de supermercado que torturam o furtador? O segurança de boate que mata o cliente com um golpe fulminante? O policial que abusa do poder para espancar e matar (muitas vezes crianças e pessoas de bem)? O chefe que persegue subordinados que se destacam e são mais inteligentes do que ele? O árbitro de futebol que leva jogadores e torcedores à loucura com sua atuação voltada a prejudicar uma agremiação? Pois bem, esses são exemplos típicos de conduta de pessoas portadoras da síndrome do pequeno poder.

É bom, portanto, que fiquemos atentos aos portadores da síndrome do poder e da síndrome do pequeno poder. Eles podem, com muita facilidade, prejudicar direitos e garantias legais que possuímos. Nossa conduta deve ser reativa quando ameaçados ou prejudicados por esses seres perversos. Significa denunciar e militar para que fiquem longe do poder. O poder é uma arma com grande potencial de destruição nas mãos deles.

Eu poderia falar, também, da síndrome do poder nas relações familiares, outra perigosa moléstia, mas esse é um capítulo à parte. Um dia falaremos sobre o tema.