Ações por dívidas junto a instituições financeiras aumentam em Ribeirão Preto

São quase 600 ações ajuizadas na cidade desde o início da pandemia; valor soma mais de R$ 180 milhões

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Santander, Banco do Brasil, Itaú e Bradesco somaram, juntos, R$ 183.492.614,69 em 599 novos processos de dívidas de empresa e pessoas físicas ajuizadas em Ribeirão Preto desde o 1º semestre de 2020, de acordo com um levantamento feito pelo escritório Mendonça e Segatto Advocacia. A pesquisa inclui ações contra pessoas físicas e jurídicas que não inclui processos que correm em segredo de justiça.

O levantamento mostra que houve aumento de 45,8% de novas ações no primeiro semestre de 2020, início da pandemia, em comparação com o primeiro semestre de 2021. Se a comparação for feita em relação ao primeiro semestre de 2019, o primeiro semestre de 2021 acumula aumento de 142%.

O advogado Francisco Mendonça prevê que a escalada de ações continue aumentando. “Foram R$ 31 milhões em novas ações ajuizadas no primeiro semestre de 2019, R$ 52 milhões no primeiro semestre de 2020 e um salto para R$ 77 milhões no primeiro semestre de 2021. Em um primeiro momento, os bancos renegociaram os débitos em 2020, as empresas e pessoas físicas não conseguiram pagar e houve uma explosão de novas ações judiciais, o que deve continuar crescendo neste segundo semestre e ainda em 2022”, alerta.

Histórico

1º semestre de 2019 – 184 ações – valor de R$ 31.812.268,75

2º semestre de 2019 – 167 ações – valor de R$ 49.966.889,73

1º semestre de 2020 – 158 ações – valor de R$ 52.829.636,58

2º semestre de 2020 – 185 ações – valor de R$ 53.616.432,17

1º semestre de 2021 – 256 ações – valor de R$ 77.047.545,94

Cenário das empresas no Brasil

A cidade de Ribeirão Preto, reconhecida pela economia pujante há décadas, não escapou do cenário que coloca o Brasil em 3º lugar na lista dos países mais endividados. Estudo da consultoria britânica Oxford Economics, feito nos meses de fevereiro, março e abril, aponta que os débitos das empresas brasileiras cresceram quase 15%. Os bancos centrais adotaram a liberação de créditos durante a pandemia em vários países, mas, segundo a Oxford Economics, as dívidas das empresas em países desenvolvidos poderiam subir até 10%, chegando a 95% do PIB, só que nos emergentes, como o Brasil, esse montante tem avançado entre 10 e 20 pontos percentuais – o levantamento inclui somente empresas que não fazem parte do setor financeiro.

Empresas brasileiras terão de pagar, nos próximos dois anos, dívidas que representam 45% de seu lucro líquido – o maior percentual de endividamento entre sete países emergentes analisados no estudo do BIS-Banco de Compensações Internacionais, considerado uma espécie de banco dos bancos centrais.

Contratos bancários

Mendonça lembra que em 2020, a pandemia começou a impactar fortemente os negócios e os bancos renegociaram as dívidas com prazo de carência. “No início de 2021 a inadimplência já estava alta porque empresas não conseguiram honrar dívidas. Os bancos então derrubaram drasticamente os juros do crédito imobiliário e as empresas optaram por refinanciar dívidas. Na prática, os bancos trocaram contratos sem garantia por dívidas garantidas e agora os clientes estão entregando imóveis para pagar seus financiamentos”, analisa.

A taxa de juros cobrada por bancos colabora com o agravamento deste cenário. Ele explica que há uma taxa média de juros de mercado apurada pelo Banco Central que deve nortear os contratos bancários. “Mas as instituições financeiras cobram de 40% a 200% acima da taxa média ou mais em alguns casos”, ressalta.

A conhecida Lei de Usura, de 1933, que considera abusivas taxas acima de 12% ao ano não é aplicada aos bancos. Apenas empresas e pessoas físicas estão sujeitas a ela.

Além disso, há várias condições na relação com os bancos que vêm dificultando a recuperação dos negócios:

– Venda casada: para liberar um contrato, o banco oferece títulos de capitalização, previdência privada, seguros e outros produtos.

-TAC: a Tarifa de Abertura de Crédito só pode ser cobrada uma vez, no primeiro contrato com o banco e não pode ser cobrada em qualquer outro empréstimo.

-Juros capitalizados ou juros sobre juros: esse tipo de cobrança só pode ser feito se a condição estiver descrita no contrato em linguagem didática para o cliente.

-É preciso considerar o encadeamento de contrato com a instituição financeira; ou seja, todo o histórico da dívida e os contratos firmados em sucessivas renegociações.

A pandemia agravou a situação financeira das empresas, mas não é o único ou principal fator do aumento do endividamento. “O empresário pode ter se endividado por despreparo, por desconhecer as regras e por facilidades que os bancos oferecem que, na verdade, se tornam um problema a mais”.

O questionamento dos contratos bancários pode gerar um deságio entre 30% e 70% no montante da dívida. É imprescindível para o empresariado a adoção de modelos de gestão que tornem a empresa sustentável e mais resiliente a cenários de vulnerabilidade.