Sem licitação, prefeitura contrata empresa investigada em esquemas de corrupção para emitir notas fiscais em Ribeirão

Empresa poderá ter lucro de até R$ 5 milhões operando sistema, segundo especialista; pagamento virá do bolso dos empresários

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Prefeitura de Ribeirão irá trocar programa para emissão de nota - Foto: Divulgação

A prefeitura de Ribeirão Preto contratou, sem licitação, a empresa Nota Control para fazer a emissão de notas fiscais para empresas que recolhem Imposto Sobre Serviço (ISS) na cidade. A empresa é investigada em ações civis públicas por corrupção, fraude e improbidade administrativa em ao menos três Estados e seis cidades.

A informação foi levantada pelo Grupo Thathi de Comunicação e divulgada com exclusividade pelo radialista Lincoln Fernandes durante o programa Thathi repórter desta terça-feira 28). A princípio, a prefeitura de Ribeirão Preto abriu uma licitação para contratar uma empresa para prestar o mesmo serviço mas, depois, optou por suspender o processo de licitação, onde haveria disputa entre as empresas, e contratou, sem licitação, da Nota Control.

A empresa já foi investigada em ações civis públicas que corre em Cuiabá, Andradina, Dourados e Jaguariúna, entre outros municípios, sendo que um de seus sócios, Nerone Maiolino Junior, chegou a ser condenado a cinco anos de prisão pela participação em um esquema de corrupção que consistia em fraudes a licitações e corrupção ativa na prefeitura de Dourados.

Além disso, o serviço, que hoje é gratuito para o empresário que emite a nota, passará a ser pago. Nem a prefeitura nem a empresa informaram qual é o custo de operação do sistema, que será gratuito por quatro meses e depois deverá ser pago posteriormente.

A reportagem do Grupo Thathi tentou encontrar o termo de referência da contratação, mas, como tem se tornado rotina da administração, o documento não foi disponibilizado no Portal da Transparência. Não é possível saber, portanto, quais os termos exatos da prestação de serviço, nem qual a expectativa de lucro da empresa.

Sem dados

Marcelo Ramos Reis, que é especialista em licitações, considera que o procedimento foi irregular. “Primeiro de tudo, o prazo para uma contratação emergencial é de 180 dias, e o contrato é de um ano. Além disso, a Nota Control vai receber, dos empresários, para fornecer um serviço que hoje é gratuito, onerando o contribuinte e liberando a prefeitura da obrigação de oferecer um serviço de qualidade e gratuito”, conta.

Segundo o profissional, a empresa deverá lucrar aproximadamente R$ 400 mil mensais, o que totalizaria algo em torno R$ 5 milhões por ano. “Por ser uma contratação emergencial, sem licitação, não houve a possibilidade de outras empresas participarem dessa licitação. O que parece é que houve uma contratação direta”, conta.

Licitação

Para o advogado Gustavo Bugalho, especialista em direito administrativo, a qualificação de emergencial da compra pode ser contestada na Justiça. “A dispensa emergencial deve ser sempre utilizada em última hipótese, hipótese excepcionalíssima e apenas pelo tempo necessário para a abertura do certame correspondente e em casos imprevistos. O ordenamento jurídico brasileiro rechaça fortemente o “emergencial” fabricado, ou seja provocado e de longa duração, prevendo a possibilidade de declaração de nulidade caso apontados tais vícios”, ressaltou o jurista.

O auditor fiscal Frederico Ferri, que trabalha em Serrana, afirmou que conhece a empresa Nota Control e não recomenda o serviço da empresa, que já atuou em Serrana. “Eles bagunçaram o banco de dados, os contribuintes não tinham acesso às notas anteriores. Eles não vão dar conta, vai criar um problema para o próximo governo. É temerário entrar essa empresa pra fazer a gestão dos serviços”, informou.

Planos

A reportagem falou com a Nota Control. Uma funcionária da empresa explicou que serão oferecidos planos de R$ 7,90 por mês, para microempreendedores individuais, e de R$ 49,90, para os demais empresários, para que as empresas possam emitir notas.

A empresa poderá disponibilizar uma área onde os empresários da cidade que não aderirem ao sistema poderão emitir as suas notas mas, para isso, a empresa terá que ter o seu próprio sistema e se encarregar de fazer a integração. Na prática, isso só torna a opção acessível a empresas de médio e grande porte.

Outro lado

Procurada, a Secretaria da Fazenda informou que a medida trará benefício aos cofres públicos, mas confirmou que vai mexer no bolso do empresário. “A empresa contratada para emissão de nota fiscal eletrônica receberá R$ 3.800,00 ao ano pelo serviço de licença de uso do sistema de gestão do Imposto Sobre Serviços (ISS), diferente do contrato anterior que era de R$ 2.760 milhões. O novo contrato permitirá economia aos cofres públicos de aproximadamente R$ 2,7 milhões por ano”, afirmou a Secretaria.

Ainda segundo a Secretaria, a conta vai cair no colo dos empresários que emitem nota fiscal na cidade. “A partir de agora (…)este valor deverá ser pago apenas pelos prestadores de serviços e não mais pelos munícipes, mesmo aqueles que não são emissores de notas fiscais, tornando assim, o valor a ser pago, de responsabilidade apenas do usuário emissor das notas”.

A prefeitura afirmou, ainda, que “as empresas podem optar por versões gratuitas de sistemas que emitem notas fiscais e que, durante quatro meses não haverá custo para emissão das notas” e que “a medida possibilitará que o valor economizado com o novo contrato seja revertido para Saúde e Assistência Social”.